quinta-feira, 24 de junho de 2010

Para desglobar

Desanamariabrague-se

Desxuxe-se

Desomofobe-se

Desgalvãobuene-se

Desipócrete-se

Desraciste-se

Deswaltdisney-se

Deshollywoode-se

Desviralate-se

Desemburreça-se

Desdeseduque-se

Despasteurize-se

Desneoliberalize-se

Dessubmisse-se

Desmanipule-se

Deselite-se

Desmude-se

Deslucianohucke-se

Desjosoares-se

Desfautosilve-se

Desivetesangale-se

Desfantastique-se

Desbigbrother-se

Descatolize-se

Desdurma

Deshomersimpsom-se

Desapolitique-se

Desnovelize-se

domingo, 20 de junho de 2010

Da vida e além

O pré-natal:

Clara: huum

Tales: huum

O pós-natal:

Clara: Olá! Quanta luz!

Tales: Que frio!

A pré-infância:

Clara: Meu papai!

Tales: Minha mãe!

A infância:

Clara: A minha é mais bonita!

Tales: O meu é maior!

A pré-adolescência:

Clara: Por que não posso?

Tales: Não quero!

A adolescência:

Clara: Eu amo tanto o Felipe!!!

Tales: Vai Corinthians!!!

A pré-juventude:

Clara: Quanta infantilidade.

Tales: Vai Corinthians!!!

A juventude:

Clara: É só isso que eu significo para você?

Tales: Vamo no jogo do Corinthians?

O pré-adulto:

Clara: O ser humano é egoísta e a vida é efêmera.

Tales: Dei duzentos e vinte na reta!

O adulto:

Clara: Sim! Meu amor!

Tales: Sim.

A maturidade:

Clara: Tenho uma coisa para te contar...

Tales: Você tá falando sério?!?

A maternidade e a paternidade:

Clara: Meu amor!

Tales: Ah moleque!

A meia idade:

Clara: Vem cá, meu filho...

Tales: Boa viagem, meu filho!

A velhice:

Clara: Vem cá, meu velho...

Tales: Cadê meus óculos?!?

O fim:

Clara: Que saudades!

Tales: Que saudades!

O pós-fim:

Clara: huum! Que silêncio!

Tales: Huum.

No carnaval

Ilustração: Sérgio Antunes



Passar o carnaval por aqui é incondicional e imperativo. Passa todos os anos a dona do cachorrinho que nunca recolhe os vestígios do bicho. Passou ontem a mulher do vizinho, a passos largos com suas malas à procura de novo lar. Havia passado antes uma outra, mais jovem e sensual com destino ao mesmo endereço. Passado, o marido correu, mas não alcançou a antiga esposa. Passaria em outros tempos até a sogra com o seu marido atrás para cobrar satisfações do infiel se não tivessem passado desta para melhor há um ano em passeio à Passo Fundo. Passar-me-iam despercebidos os pobres filhos, que aos prantos com a partida da mãe, passariam a viver com a madrasta, mas todos os dias passavam outras e mais outras. Passarão os filhos a viver com a mãe, segundo a justiça. Passivo, o ex-marido se descobriu. E eu que só estava passando um tempo, peguei a condução que durante a semana passara sempre pontualmente, mas hoje não. A passagem aumentou e eu não tinha dinheiro suficiente - Passe por baixo – sugeriu o generoso cobrador. Uma passeata interrompeu nosso caminho e olhei meio “en passant”, mas pude perceber que passando estão os pobres, ricos, negros, brancos, mulatos, jovens, velhos, homens e mulheres, heterossexuais e homossexuais, crentes e ateus. E se o samba também passar, que passe com seu compasso, mulatas e passistas.

Espanta Relento

O gorila passeia pelas ruas sem ser incomodado, levando um cobertor de lã vermelho, que serviria muito bem para agasalhar-lhe o corpo não fosse o descabido volume de pêlos que ostenta orgulhosamente. Procura um refúgio, uma sombra que possa acomodar-lhe o já cansado corpo de tantas macaquices ignóbeis, que poderiam ter-lhe custado a vida, mas macaco que se preza ri e bate palmas para angariar a simpatia do público que facilmente se deixa levar. O rei simiano deposto de velho já é surdo. Perdeu o seu sentido na arena e agora vaga sem público. De selvagem lhe resta o espírito que se recusa a ceder ao corpo numa luta homérica que orgulharia à Gaia. Se pelo menos fosse dotado do dom da transformação, arranjaria um emprego num daqueles parques itinerantes, onde ainda poderia reviver seus dias de glória, mas de certo a forma humana provocaria mais medo. O cobertor vermelho de lã é o que lhe resta. Mas eis que ao longe vem chegando o Espanta Relento, com sua batucada, bandeiras rubras e mil foliões incansáveis, a cantar por mais de vinte quarteirões a mesma toada de escárnio e desabafo. Chegam para ficar, pois passar é coisa para quem gosta de perecer. O batuque vai ficando cada vez mais alto e o nosso gorila parado no meio da rua sente a vibração do chão combinado com o deslocamento do vento causado pela euforia que toma as passagens e não deixa uma pedra sem pular. O macacão é engolido pelo cordão e como não sabe viver se não for de micagens se enrola no cobertor vermelho de lã e é prontamente acolhido como o folião mor. O seu brado é o dos Kunacaca Una. Foi a primeira vez do Espanta Relento tomando as ruas da cidade. É de vermelho e gorila que vai o nosso bloco.

Existem os anjos

Eu acredito em anjos. Todo escritor tem o dever de acreditar. Pensava que só escrevia quando me vinha a inspiração, mas isso não é tão certo assim. Tenho um anjo literário que me visita e me conta coisas que me provocam e me incitam a escrever. Este anjo não tem asas e nem o seu rosto é angelical. É velho e tem uma caneta na mão direita e um caderno na esquerda. Visita-me a qualquer hora, inclusive nas mais impróprias. Só não ousa aparecer quando faço amor. É que nestas horas tenho o diabo no corpo e todos sabem que os anjos não gostam do diabo e a recíproca é verdadeira.

Bem vindo

Bem vindo

Bem vindo, vindo, vindo
bem chega
bem fica, fica, fica
bem vai
bem dito seja