quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Enfermidade




Do leito da profundidade mais abissal até a última película da exosfera, não há um ser capaz de decifrar o mistério das sandices desenfreadas que cometemos contra nossa própria saúde física, quando o amor não nos deixa outra alternativa senão vivê-lo. É que a mente muito preocupada em encontrar soluções cabíveis se esquece de gozar e acaba dando-se por satisfeita com a perfeição dos paradigmas das palavras. Mas não estaria eu  tropeçando em  minha própria arapuca, numa tentativa racional de enquadramento, uma vez que ao invés de explicar, deveria mesmo estar usufruindo de minha doença ou sabotagem da saúde, se assim o preferir?

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Fortuna original







Nasceu miserável e nem por isso era infeliz. Seus esforços por riquezas materiais não vingaram, mas desejou uma fortuna que para muitos pareceria tola. Queria colecionar cumprimentos. Sim, a cada bom dia ou tarde e até noite anotava em seu bloco improvisado de rascunhos alheios, singularmente grampeados. Nada passava-lhe em branco e com doze anos  já se considerava homem de considerável status cumprimental. Porém, percebeu que os cumprimentos se repetiam  a ponto de tornar-lhe a tarefa entediante, mas não se daria por vencido com uma aparente dificuldade linguística de seus fornecedores. A demanda por novos cumprimentos acarretou no divórcio entre o espírito desapegado de vaidades fúteis e o próprio ego colecionador. Dedicava-se em tempo integral ao mundo, à vida, aos seres e não seres. Viveu de universo até que seu corpo imergisse no imensurável, tornando sua presença digna de memória da mais simples bactéria, que por sua vez retribuia sua gratidão em forma de cumprimentos. Calculadoras, computadores, bancos e até as mentes mais brilhantes sucumbiram em sua ingrata tarefa de contabilizar sua eternamente crescente fortuna. Tornou-se o maior de todos os milhonários.