quinta-feira, 14 de abril de 2011

A clausura do sem-povo



                                                                                             Fotografia: Lisandra Arantes

Foi hoje cedo que abriu sua janela e deu de cara com o povo. Se a mantivesse fechada não teria visto povo de gravata, de marmita, de bicicleta, de motorista particular, povo com povo na barriga. Tinha povo que dormia sob a marquise, que se bronzeava na areia, que falava ao telefone. Tinha um povo que descia do morro e que no bar da esquina tomava cafezinho com pão quente na chapa. Tinha outro povo que chegava ao morro vindo não se sabe ao certo de que samba, mas que era feliz, assim como todos os outros, que à sua maneira se sabiam povo do mesmo povão que juntos formam uma nação inseparável, nem sempre reconhecida, posto que nem sempre vista pelos olhos da decência, não menos digna de respeito do que qualquer outro povo. Não muito à vontade, banhado em perfume barato, foi deixando-se misturar. Permaneceu em sua janela até que alguém o pudesse ver. Ao ser avistado, percebeu que ao povo não merecia pertencer. Fechou para sempre a maldita janela para enfim viver como povo de um homem só.

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