Andando pela rua, assoviava umas notas despretensiosas de um
samba muito antigo.
Era uma melodia feliz, enredada por melancolia de cor azul e
uma nostalgia de fundo branco.
Um passarinho pousou em meu ombro e soprou – És poeta? – Ora,
claro que não – respondi com tom de surpresa. Ele insistiu – então és
compositor? – parecia zombar de mim – Claro que não, por que perguntas?
Tão linda melodia – disse ele – tem raíz forte, cheiro de escura
madeira, poesia repleta de luz. Beleza assim só ouvi em Madureira e Oswaldo
Cruz.
Alegrei-me e arrisquei mais algumas notas. Seguíamos os dois
a cantarolar em assovio, ele em meu ombro, eu sob seus frágeis pés. Outros dois
também pousaram e juntaram-se à cantoria. Éramos agora, um desfile, um cordão,
uma alegoria.
E o samba saía de nossas bocas, doce como mangas suculentas
que toda criança quer. Como aqueles cantados no quintal de Dona Esther. Os acordes
eram de gosto fino, desenhados no grafite suburbano e defendidos em voz
altaneira. Como faziam Rufino, Caetano e Paulo Benjamim de Oliveira.
Era uma calçada de um bairro comum e era nossa passarela. Não
assoviávamos para o rei, para o cacique, nem para juíz algum. Celebrávamos o
samba, no cair da tarde, brindando à noite bela.
O sol nasceu e dos meus amigos me despedi. Voaram os
passarinhos de volta a seus ninhos, mas prometendo sempre voltar. Tão logo
falemos de alegria, tão emocionados nos pusermos a cantar.
E eu que sonhei acordado, agora fecho meus olhos para enfim
repousar. Pois como já dizia o poeta, se eu for falar da Portela, hoje não vou
terminar.
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