Há um silêncio no ar que de tão denso
corta-se com uma faca.
É a ansiedade que precede o
acontecimento preparado por muitas mãos, cabeças e corações e que mesmo os mais
experientes e esperançosos ainda não são capazes de fugir.
Não se pode saber quantos milhões de
olhos estarão voltados para aqueles setecentos metros de comprimento por onde
passarão os devaneios concretizados por artistas famosos que ganham vida nos
corpos anônimos em nome da celebração da alegria, da crítica marota e principalmente,
da arte de rir na cara da realidade imperiosamente dura.
Durante o ano que antecedeu este
momento, por várias vezes, acordado ou não, via a mim mesmo, como se estivesse
sobrevoando a avenida, fantasiado e em pleno estado de êxtase sambando e
vivendo o sonho de contribuir diretamente para a realização não de um sonho,
mas uma meta, que é ver a Portela após tantos anos sagrar-se novamente campeã
do maior carnaval do planeta.
Felizmente, eu não sonho sozinho. Milhares,
muitos milhares além daqueles que a escola pode comportar, sonham junto comigo.
Ainda houve um último suspiro de
esperança quando surgiu a possibilidade de substituir alguém que, de última
hora, viesse a desistir. Meu coração se tornou enorme para meu pequeno peito e várias
horas de sono foram dignamente sacrificadas com o sonho desperto no qual, mesmo
deitado em minha cama, sambava e cantava o samba malandro que rasgava seu curso
até a Apoteose.
Mas como posso substituir alguem que
desiste desse privilégio? Haverá alguém capaz de declinar de tal honraria? Na minha
modesta opinião, só quem estiver morto, e assim mesmo se for um morto não
Portelense, pois Clara, Candeia, Dodô, Caetano, Paulo, Rufino, Manacéa, Doca,
Natal e muitos outros cumprirão com sua obrigação e marcarão presença.
A Portela transbordou e ao
transbordar estendeu a avenida para as arquibancadas, frisas, camarotes, ruas, calçadas
e sofás. Todos, sem demagogias e exceções, serão fundamentais para a conquista
do bem maior.
Portanto, aos fantasiados, não ousem
desistir. Sambem como se fosse o último samba de suas vidas. Pintem a vida em
azul e branco e façam da avenida o rio que nunca deixará de passar em nossas
vidas, mentes e corações.
Salve a Portela!